sexta-feira, 12 de novembro de 2010

O quinto cômodo

De todos os quartos, o quinto cômodo era o mais novo, mesmo sendo o primeiro construído. Era limpo, organizado e arejado, com duas janelas baixas e altas que quase alcançavam o teto.

O mais interessante é que o quarto não era utilizado, nunca. Dentro apenas um piano preto de cauda preenchia o ambiente, o restante da mobília era desprezível. Não era horrenda, era desprezível pelo simples fato de não ter importância alguma, de poder a qualquer momento ser substituída sem prejuízo.

Na mesa desimportante de canto, a de pernas esguias, apenas um vaso transparente com flores velhas na água turva. As cortinas de renda branca emolduravam o pouco que se via pelos vidros sujos e finamente bisotados. Nos últimos anos a única companhia da água suja era a luz do sol.

O piano acordava todo dia às seis e meia, maquinalmente. Sua laca preta empoeirada pouco refletia, mas mesmo assim, antes da cristaleira, era o único indício de vida matinal.

A cristaleira e os quatro porta-copos tinham o mesmo aspecto, frios.

Enquanto o quarto todo dormia, apenas a poeira trocava de lugar. Ora no taco de ipê, ora nas teclas de marfim.

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